Em certa noite de outono, quando dormia deitado em uma rede posta em frente a minha casa, vi em meus sonhos uma fada se aproximar. Ao se aproximar, a pequena criatura trazia em sua mão direita um lápis e na esquerda uma borracha.
Ela pousou em meus ombros e devagarzinho com sua voz branda disse:
- Esses objetos são mágicos. Com eles nas mãos basta você imaginar um trecho da história de sua vida. Com a borracha você o apaga e com lápis você o reescreve.
Nesta noite, em minha consciência, a realidade se sobrepôs ao holístico e apenas virei na rede pra continuar a sonhar.
Pela manhã, quando abri os olhos - no canto do galo das 6:00 hrs -, o sol ainda estava preguiçoso e eu ainda com remela nos cílios dei aquela tradicional “espixadinha” e percebi que na guimba do raio solar que tangenciava a rede e o vaso de tulipas, encontrava – se um lápis e uma borracha.
Por um alguns instantes não consegui compreender se estava acordado ou sonhando. Abaixei-me diante o vaso, peguei os dois objetos e sai a esmo diante o caminho que levava ao Velho Chico.
Por horas observei o caudaloso e barrento rio.
Ao chegar em casa resolvi saber se conseguiria mudar mesmo a minha história.
Primeiro lembrei de um episódio no qual um vizinho famoso por suas inverdades disse que seu piá estava doente e ele pedia dinheiro apenas para curar as enfermidades de seu primogênito. Cético, não ajudei e depois de alguns meses o bairro veio, a saber, as dificuldades e o quase óbito do menino que ficou com sérias seqüelas por causa da doença.
Passei a borracha quando estas imagens em minha mente surgiram. Reescrevi o enredo. E, ao caminhar pela cidade vi no galho mais alto do abacateiro o menino que ontem era doente.
Cismado com ocorrido, fui bar do Tororó e tomei duas da que matou o guarda e perguntei para o Anael:
- E aquele menino em cima do abateiro.
- Ara ! Num ta enxergando! É o filho do Zé Mentiroso. Este - desde piazinho -, correninho pelos campos, roubando manga, subindo em árvores. Criança esperta.
Pedi mais uma pinga e fui pra casa. Almocei e fui dormir em uma árvore perto das águas do Opará.
Quando acordei peguei os objetos mágicos e resolvi tentar novamente.
Imaginei uma cena onde certa vez um casal viajante me pediu comida. Disse a eles que daria se me ajudassem a limpar a aluvião que tinha invadido o velho paiol de madeira. Eles se negaram e em um estado de fúria xinguei a mãe deles e os escorracei de meu sitio.
Depois de certo tempo percebi como minha atitude foi egoísta, quiçá não havia mais tempo para mudar esse quadro e mesmo rezando 09 Pai Nosso, 11 Ave Maria e 82 Salve Rainha não obtive o perdão.
Peguei a borracha e apaguei todo o ocorrido deste dia ébrio. Com lápis reescrevi esta cena e adquiri o perdão.
Num instante, um alívio tomou conta da minha áurea.
Era dia de Folia de Reis, vesti meu termo, um termo muito velho que meu bisavô, deixou pro meu avô, meu avô deixou pro meu pai e o meu pai deixou pra mim. Amarelo do tempo e do pó sertanejo, esta antiga veste só deve ser usado nesta data e pelas contas que passaram de geração em geração, essa é centésima vigésima sétima vez de uso do terno bordô.
A rebeca, a viola e a sanfona anunciavam a chegada do cortejo. De longe conseguia ver abrindo o cortejo Vergílio, um crioulo de mais de 2 m de altura que há anos trazia um estandarte com a imagem do menino Jesus onde em sua volta estavam os Três Reis Magros.
Muitos doces, muita comida, muitos fogos e muita dança. Desci a velha rua do moinho pra sentar na escadaria da igreja e fumar um sabiazinho. De repente, em minha vista apareceu uma menina cheinha de sardas no rosto, pele clara e cabelo ferrugem. Ela vestia sandalhas azuis e um vestido branco todo bordado no babado com uma espécie de mandala indígena. Meu zoinho estalou e tum-tum-tum rapidamente fez meu coração.
Na mesma hora fui no sítio do velho seu Olavo e roubei uma mãozada de gardênias brancas para levar a minha amada.
Quando voltei, à praça ainda estava mais cheia, mas ao me virar em sentido a imagem de Padinho Cícero, vi aqueles olhos de jabuticabas se cruzarem aos meus e, ao ver aquele sorriso branquinho, como as nuvens da mirada daserra fui em sua direção. Foi o tempo dela me abraçar, pegar em uma mãos as flores e na outra minha mão, me puxar para dançar e correr por toda Folia de Reis até desembocarmos no São Francisco.
Como nos deliciamos com Jambo e nos melecamos com açaí. Imitava o barulho do Pássaro Bigodinho, do Cambacica e do Caboclinho Verde de Cabeça Marrom aos ouvidos de Jasmin e embaixo da Aroeira Preta do Sertão, ela ria e me beijava o pescoço.
A tarde caia, e como minha amada vinha de um vilarejo próximo, ela precisava ir embora. Quando voltamos e chegamos próximo à barraca de quitutes regionais, uma garrucha disparou. Todos corriam mulheres procuravam suas crianças e as crianças sem as mães começaram a chorar.
Senti as mãos de Jasmin cingirem as minhas com muita força e descobri que por acaso a bala havia atingido sua costa.
A partir desse ponto, a seqüência clara da história, com a borracha apaguei e com o lápis reescrevi o ocorrido.
Vi sua presença a menos de um quarto de léguas de mim. Jasmin me apareceu com a mesma roupa que estava na Festa de Reis. Corri ao seu encontro de seus braços, nos beijamos, cantamos e nos amamos debaixo da chuva até a chegada do primeiro sabia.
Adormeci e quando acordei minha amada não estava mais ao lado. Fiquei desesperado, gritei seu nome por todo bosque. A cavalo, subi e desci as veredas da floresta, vasculhei pela nuvens para ver se ela estava a voar e por seguinte, chorei, chorei e chorei.
Depois de tantas lágrimas como uma criança, adormeci e em meus sonhos, a pequena fada, mas agora mais cintilante, reapareceu e me perguntou:
- Por que chorais tanto?
Aos soluços contei toda história. A ânsia e a dor se misturaram com inconformismo revivido. As cicatrizes se abriram e saudade de Jasmin, aos poucos, tomou contava do meu ser.
A fada observou toda minha mutação astral. E quando eu desesperado pergunta a ela por que, a fada voou a frente de minhas retinas e disse:
- Os objetos mágicos mudam a história, mas jamais podem alterar o destino.
Ela pousou em meus ombros e devagarzinho com sua voz branda disse:
- Esses objetos são mágicos. Com eles nas mãos basta você imaginar um trecho da história de sua vida. Com a borracha você o apaga e com lápis você o reescreve.
Nesta noite, em minha consciência, a realidade se sobrepôs ao holístico e apenas virei na rede pra continuar a sonhar.
Pela manhã, quando abri os olhos - no canto do galo das 6:00 hrs -, o sol ainda estava preguiçoso e eu ainda com remela nos cílios dei aquela tradicional “espixadinha” e percebi que na guimba do raio solar que tangenciava a rede e o vaso de tulipas, encontrava – se um lápis e uma borracha.
Por um alguns instantes não consegui compreender se estava acordado ou sonhando. Abaixei-me diante o vaso, peguei os dois objetos e sai a esmo diante o caminho que levava ao Velho Chico.
Por horas observei o caudaloso e barrento rio.
Ao chegar em casa resolvi saber se conseguiria mudar mesmo a minha história.
Primeiro lembrei de um episódio no qual um vizinho famoso por suas inverdades disse que seu piá estava doente e ele pedia dinheiro apenas para curar as enfermidades de seu primogênito. Cético, não ajudei e depois de alguns meses o bairro veio, a saber, as dificuldades e o quase óbito do menino que ficou com sérias seqüelas por causa da doença.
Passei a borracha quando estas imagens em minha mente surgiram. Reescrevi o enredo. E, ao caminhar pela cidade vi no galho mais alto do abacateiro o menino que ontem era doente.
Cismado com ocorrido, fui bar do Tororó e tomei duas da que matou o guarda e perguntei para o Anael:
- E aquele menino em cima do abateiro.
- Ara ! Num ta enxergando! É o filho do Zé Mentiroso. Este - desde piazinho -, correninho pelos campos, roubando manga, subindo em árvores. Criança esperta.
Pedi mais uma pinga e fui pra casa. Almocei e fui dormir em uma árvore perto das águas do Opará.
Quando acordei peguei os objetos mágicos e resolvi tentar novamente.
Imaginei uma cena onde certa vez um casal viajante me pediu comida. Disse a eles que daria se me ajudassem a limpar a aluvião que tinha invadido o velho paiol de madeira. Eles se negaram e em um estado de fúria xinguei a mãe deles e os escorracei de meu sitio.
Depois de certo tempo percebi como minha atitude foi egoísta, quiçá não havia mais tempo para mudar esse quadro e mesmo rezando 09 Pai Nosso, 11 Ave Maria e 82 Salve Rainha não obtive o perdão.
Peguei a borracha e apaguei todo o ocorrido deste dia ébrio. Com lápis reescrevi esta cena e adquiri o perdão.
Num instante, um alívio tomou conta da minha áurea.
Era dia de Folia de Reis, vesti meu termo, um termo muito velho que meu bisavô, deixou pro meu avô, meu avô deixou pro meu pai e o meu pai deixou pra mim. Amarelo do tempo e do pó sertanejo, esta antiga veste só deve ser usado nesta data e pelas contas que passaram de geração em geração, essa é centésima vigésima sétima vez de uso do terno bordô.
A rebeca, a viola e a sanfona anunciavam a chegada do cortejo. De longe conseguia ver abrindo o cortejo Vergílio, um crioulo de mais de 2 m de altura que há anos trazia um estandarte com a imagem do menino Jesus onde em sua volta estavam os Três Reis Magros.
Muitos doces, muita comida, muitos fogos e muita dança. Desci a velha rua do moinho pra sentar na escadaria da igreja e fumar um sabiazinho. De repente, em minha vista apareceu uma menina cheinha de sardas no rosto, pele clara e cabelo ferrugem. Ela vestia sandalhas azuis e um vestido branco todo bordado no babado com uma espécie de mandala indígena. Meu zoinho estalou e tum-tum-tum rapidamente fez meu coração.
Na mesma hora fui no sítio do velho seu Olavo e roubei uma mãozada de gardênias brancas para levar a minha amada.
Quando voltei, à praça ainda estava mais cheia, mas ao me virar em sentido a imagem de Padinho Cícero, vi aqueles olhos de jabuticabas se cruzarem aos meus e, ao ver aquele sorriso branquinho, como as nuvens da mirada daserra fui em sua direção. Foi o tempo dela me abraçar, pegar em uma mãos as flores e na outra minha mão, me puxar para dançar e correr por toda Folia de Reis até desembocarmos no São Francisco.
Como nos deliciamos com Jambo e nos melecamos com açaí. Imitava o barulho do Pássaro Bigodinho, do Cambacica e do Caboclinho Verde de Cabeça Marrom aos ouvidos de Jasmin e embaixo da Aroeira Preta do Sertão, ela ria e me beijava o pescoço.
A tarde caia, e como minha amada vinha de um vilarejo próximo, ela precisava ir embora. Quando voltamos e chegamos próximo à barraca de quitutes regionais, uma garrucha disparou. Todos corriam mulheres procuravam suas crianças e as crianças sem as mães começaram a chorar.
Senti as mãos de Jasmin cingirem as minhas com muita força e descobri que por acaso a bala havia atingido sua costa.
A partir desse ponto, a seqüência clara da história, com a borracha apaguei e com o lápis reescrevi o ocorrido.
Vi sua presença a menos de um quarto de léguas de mim. Jasmin me apareceu com a mesma roupa que estava na Festa de Reis. Corri ao seu encontro de seus braços, nos beijamos, cantamos e nos amamos debaixo da chuva até a chegada do primeiro sabia.
Adormeci e quando acordei minha amada não estava mais ao lado. Fiquei desesperado, gritei seu nome por todo bosque. A cavalo, subi e desci as veredas da floresta, vasculhei pela nuvens para ver se ela estava a voar e por seguinte, chorei, chorei e chorei.
Depois de tantas lágrimas como uma criança, adormeci e em meus sonhos, a pequena fada, mas agora mais cintilante, reapareceu e me perguntou:
- Por que chorais tanto?
Aos soluços contei toda história. A ânsia e a dor se misturaram com inconformismo revivido. As cicatrizes se abriram e saudade de Jasmin, aos poucos, tomou contava do meu ser.
A fada observou toda minha mutação astral. E quando eu desesperado pergunta a ela por que, a fada voou a frente de minhas retinas e disse:
- Os objetos mágicos mudam a história, mas jamais podem alterar o destino.
Contado por um caboclo
Adaptação Mauricio Hermann
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